O potencial da biodiversidade e os acordos internacionais: o caminho do Brasil para o protagonismo global

Apesar de ser um dos países mais biodiversos do mundo, o Brasil ainda enfrenta entraves para transformar esse patrimônio natural em inovação com impacto global.

Nos últimos anos, o Brasil tem dado passos importantes rumo à liderança no uso sustentável da biodiversidade. Avanços regulatórios, iniciativas empreendedoras e a consolidação de uma infraestrutura científica de excelência demonstram que o país está construindo as bases de um ecossistema promissor, capaz de transformar sua riqueza biológica em soluções inovadoras com impacto global.

O Brasil é um país megadiverso, com uma potência biológica e cultural sem paralelos. Essa biodiversidade não é apenas um tesouro ecológico, mas um ativo estratégico para o desenvolvimento científico, econômico e social. O caminho ainda exige superação de desafios, mas os sinais de mudança são cada vez mais visíveis — com projetos que unem ciência, negócios e responsabilidade socioambiental.

Nesse contexto, acordos internacionais como o Protocolo de Nagoya ganham relevância ao proporem uma lógica mais justa e sustentável de acesso aos recursos genéticos e ao conhecimento tradicional associado. Peter Andersen, CEO do Grupo Centroflora, defende que o país precisa criar um ambiente mais fértil para startups e empresas de base científica que atuam com insumos da biodiversidade. 

Para ele, o Brasil possui uma vantagem competitiva natural, mas ainda não conseguiu desenvolver um ecossistema robusto que conecte ciência, negócios e sustentabilidade. “O Brasil possui 25% da biodiversidade do planeta, mas o país ainda faz pouco para transformar esta biodiversidade em um ativo estratégico. Por isso, devemos estimular soluções junto a todos os stakeholders envolvidos nesse processo, para que as coisas mudem.” afirma Andersen. 

Essa percepção dialoga com a experiência da equipe da Nintx, startup brasileira voltada à identificação de novos bioativos com aplicação farmacêutica e nutracêutica. Entretanto, apesar de Stephani Saverio, Cristiano Guimarães e Miller Nunes de Freitas reconhecerem a complexidade de nosso ecossistema, a Nintx possui know-how e track record para mudar esse cenário. A empresa respeita o conhecimento tradicional e os recursos genéticos do Brasil e acredita que a melhor maneira de gerar, capturar e repartir valor a partir deles é por meio de ciência de ponta, desenvolvendo projetos com atratividade global. Na visão da Nintx, a lei da Biodiversidade de 2015 já representou um avanço importante na organização do tema que os atores relevantes no Brasil podem continuar apoiando o avanço do arcabouço legal e regulatório ao gerar um ciclo virtuoso de investimento e compartilhamento de benefícios com a sociedade ao trabalhar para viabilizar mais projetos inovadores e de alcance global. Stephani Saverio ainda destaca que, independentemente da lei, sempre que a Nintx estiver envolvida na pesquisa e desenvolvimento de um novo bioativo, farmacêutico ou nutracêutico, a empresa buscará formas de repartir benefícios com o meio-ambiente e a sociedade.

A partir da perspectiva das organizações que atuam no fortalecimento do ecossistema de inovação, Isabela Allende, Gerente de Operações e Parcerias da Biominas Brasil, destaca os entraves que ainda existem entre a legislação e a realidade enfrentada pelas startups e empreendedores que trabalham com ativos naturais e biodiversidade no Brasil. “Podemos dividir os entraves em duas categorias: primeiro relacionada ao conhecimento, tanto de desenvolvimento de produto quanto de criação de negócios. (…) O segundo desafio é relacionado a viabilidade financeira, muitos potenciais produtos excelentes morrem por não conseguirem recursos para o desenvolvimento correto, possuem dificuldades em comprovar a escalabilidade e viabilidade de produção.”, afirma. 

Ainda assim, há um movimento crescente de apoio e estruturação do ecossistema. Para a Gerente de Operações e Parcerias, é fundamental que as startups tenham apoio. “A Biominas tem criado espaços virtuais e físicos para gerar conexões entre projetos e startups que utilizam a biodiversidade como ativo e inspiração para seus produtos e serviços. Um exemplo disso é o evento InovafitoBrasil Summit, que conecta atores nacionais e internacionais com foco em gerar cooperações de pesquisa e também de desenvolvimento.”, destaca.

Para Norberto Prestes, Presidente Executivo da Abiquifi, os desafios ainda são grandes, apesar dos avanços: “A gente tem estrutura para desenvolvimento, nós temos conhecimento, mas nós temos ainda que romper algumas barreiras relacionadas à regulação, relacionadas à lei de acesso à biodiversidade. Apesar de ter melhorado o processo, acho que ainda faltam ajustes para encorajar o investidor, as farmacêuticas a investirem nesse processo”.

Ele também ressalta o potencial de aceleração da pesquisa e desenvolvimento por meio de ativos como o CNPEM: “Nós avançamos muito, não podemos desconsiderar o CNPEM, que construiu e opera o acelerador de elétrons Sirius, que é uma ferramenta que poucos países possuem”.

Ciência e Infraestrutura científica a favor da biodiversidade e da bioeconomia sustentável 

Do lado da ciência, Daniela Trivella, Head de Drug Discovery no LNBio-CNPEM, Maria Augusta Arruda, Director, LNBio-CNPEM e Antônio José Roque da Silva, General Director, CNPEM defendem que o Brasil está em um momento decisivo para consolidar seu protagonismo no uso responsável da biodiversidade. Segundo eles, o país tem uma biodiversidade inigualável, infraestrutura científica avançada e talentos qualificados, mas ainda enfrenta gargalos em investimento e escala de execução de projetos aplicados. 

Os pesquisadores também reforçam que a repartição de benefícios deve ser entendida como parte do processo científico, e não apenas como uma obrigação jurídica. “Temos que melhorar mecanismos de repartição de benefícios, o que pode ser feito com melhor rastreabilidade do fluxo de informação e mapeamento das contribuições. Grandes melhorias foram realizadas a partir da Lei de Acesso ao Patrimônio Genético de 2015”, porém ainda existem desafios legais a serem vencidos para a comercialização e repartição de benefícios. 

Segurança jurídica e construção de confiança

A necessidade de simplificação e de construção de confiança entre os diferentes elos da cadeia também é levantada por Anita Pissolito, da Nascimento Mourão. Para ela, o marco legal brasileiro, embora baseado em princípios corretos, ainda carece de instrumentos práticos que facilitem sua implementação. “O fato de o artigo 10 do Protocolo de Nagoya ainda não ter sido regulamentado gera insegurança jurídica, já que em muitas situações os recursos genéticos são transfronteiriços, o que não permite a rastreabilidade e por consequência impede a relação bilateral para o atendimento às regras do Protocolo. Além disso, o fato de cada Estado ser soberano sobre seus recursos genéticos permite que cada um crie sua própria legislação, com regras díspares, o que exige do usuário de biodiversidade o acompanhamento e monitoramento da legislação de cada país de origem do recurso genético utilizado.”, explica. 

A especialista defende uma abordagem mais colaborativa entre comunidades tradicionais, instituições de pesquisa, setor produtivo e Estado, além da necessidade de o país assumir uma postura mais ativa na agenda internacional.

Já do ponto de vista da indústria, Giuliano Rodrigo Barissa, Diretor de Novos Negócios e Inovação da Biolab Farmacêutica, traz uma visão pragmática sobre as oportunidades e desafios enfrentados por empresas que investem em ativos naturais. Segundo ele, a Biolab tem histórico em P&D baseado em insumos da biodiversidade e há uma importância de segurança jurídica e clareza nos processos de autorização. “O processo de pesquisa e desenvolvimento (P&D) de novos fármacos é longo e oneroso, podendo levar anos até sua conclusão. Para assegurar a segurança e a eficácia dos medicamentos, são necessários estudos clínicos rigorosos e evidências científicas robustas que sustentem seu registro regulatório. Todas essas etapas demandam investimentos substanciais, o que representa um desafio especialmente para a indústria farmacêutica nacional.”, afirma. 

Ele também aponta a necessidade de diálogo constante com as comunidades e com os órgãos reguladores, para que o desenvolvimento tecnológico seja feito com responsabilidade e legitimidade.

Biodiversidade e inovação: as bases do protagonismo brasileiro

A partir dessas diferentes perspectivas, fica claro que o Brasil reúne todos os elementos necessários para transformar sua biodiversidade em vetor de desenvolvimento sustentável: conhecimento científico, capacidade empreendedora, diversidade cultural e riqueza biológica. As bases já estão sendo construídas, com avanços regulatórios, investimentos em infraestrutura de pesquisa e iniciativas inovadoras que respeitam a sociobiodiversidade.

O sucesso dessa transformação depende agora de um esforço contínuo para fortalecer o ambiente regulatório, estimular a colaboração entre os diferentes atores e apoiar o desenvolvimento de soluções que unam ciência, negócios e responsabilidade socioambiental. Com as alianças certas e um olhar estratégico para a inovação, o Brasil tem todas as condições de se tornar um protagonista global no uso sustentável da biodiversidade.

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Este artigo faz parte da 9° edição da revista bioBr, uma publicação realizada anualmente pela Abiquifi em parceria com a ApexBrasil por meio do projeto Brazilian Pharma & Health. Para conferir a revista completa, acesse: https://issuu.com/abiquifi/docs/biobr_9th_edition

Revisão da Alíquota de Importação da Heparina Sódica

A ABIQUIFI se manifestou sobre a decisão do GECEX que restabeleceu a alíquota original de importação da Heparina Sódica (NCM 3001.90.10), retirando-a da lista de produtos com tarifa zero. Segundo a associação, a medida:

Reflete a superação da condição emergencial que justificava a redução tarifária;

Reconhece a capacidade produtiva nacional e regional para abastecimento regular;

Promove isonomia nas condições de mercado.

A redução anterior da alíquota, iniciada durante a pandemia de COVID-19 e prorrogada até 14/08/2025, visava atender a um desequilíbrio temporário entre oferta e demanda. Com o cenário normalizado, a decisão atual garante regras equilibradas para produtores nacionais e internacionais, reforçando previsibilidade regulatória, estimulando investimentos locais e consolidando um ambiente de concorrência justa na cadeia de insumos farmacêuticos.

Inteligência Artificial e o Novo Horizonte da Descoberta de Fármacos

Avanços recentes demonstram o potencial da IA em acelerar etapas críticas da P&D farmacêutica, da triagem virtual à personalização terapêutica.

Em meio à revolução tecnológica que transforma diferentes setores, a Inteligência Artificial (IA) vem assumindo um papel de protagonismo no desenvolvimento de medicamentos — uma das áreas mais complexas e fundamentais para a saúde humana. Se antes o processo de pesquisa e desenvolvimento (P&D) de novos fármacos era longo, caro e muitas vezes guiado por tentativa e erro, hoje a realidade começa a mudar com o uso de algoritmos sofisticados e modelos preditivos avançados.

Na vanguarda dessa transformação estão empresas como a Ten63 Therapeutics e a Servier, além de instituições acadêmicas como a Universidade Federal de Goiás (UFG), por meio do Centro de Excelência em Inteligência Artificial (CEIA). Essas organizações demonstram como a IA está remodelando todas as etapas da cadeia de desenvolvimento de medicamentos, desde a descoberta de moléculas promissoras até a condução de ensaios clínicos mais precisos e eficientes.

Revolucionando a jornada da inovação farmacêutica

A Ten63, startup norte-americana especializada na aplicação de IA para descoberta de medicamentos, utiliza a tecnologia desde o início da jornada. De acordo com Marcel Frenkel, CEO e cofundador brasileiro da empresa, o foco está na geração e otimização de novas moléculas.

Essa abordagem permite explorar um espaço químico praticamente infinito. A IA também acelera cálculos baseados em química quântica, aumentando a precisão na previsão de interações moleculares e das propriedades farmacocinéticas e farmacodinâmicas dos compostos. Mas Frenkel destaca que a supervisão humana continua essencial:

“IA não é infalível: sem a supervisão de especialistas, ela pode gerar previsões enganosas. Por isso, é importante mantermos cientistas no centro do processo decisório, usando IA como ferramenta de apoio e aceleração, não como substituto da expertise humana.”

Acelerar ensaios clínicos e encurtar o tempo até o paciente

Também com foco na inovação, a Servier, grupo farmacêutico internacional, vem investindo na integração da IA aos seus processos de P&D. Para Sandro Albuquerque, Diretor de Patient Access & Public Affairs da empresa no Brasil, a tecnologia já é parte central da estratégia:

“A IA se tornou um importante vetor para o processo de inovação, contribuindo tanto para a aceleração do desenvolvimento de novas moléculas quanto para a otimização tanto no desenho quanto na análise de resultados dos ensaios clínicos.”

Com milhões de moléculas potenciais a serem avaliadas, a IA se mostra fundamental:

“Temos hoje cerca de 111 milhões de substâncias químicas catalogadas em bases como o PubChem. Uma pequena fração, quando analisado, por análise combinatória no desenho de moléculas. São cerca de 10 mil decilhões de potenciais moléculas bioativas. E é aqui que a IA se destaca, pela capacidade de volume, velocidade e qualidade do processamento e análise de dados. (…) Estamos apenas nos primeiros dias desse novo alvorecer da IA”

Pesquisa aplicada na universidade

No Brasil, o CEIA da UFG tem demonstrado o impacto positivo da IA no desenvolvimento de medicamentos. Segundo o professor Arlindo Galvão, a tecnologia é aplicada em diversas frentes:

“A IA tem sido utilizada para a descoberta de novos compostos bioativos (hits) e para a otimização de protótipos, acelerando e aumentando a eficácia e eficiência dos processos. Além disso, a aplicação de modelos preditivos para a avaliação de toxicidade de fármacos e cosméticos é uma área de destaque, permitindo a antecipação de efeitos adversos e contribuindo para a segurança dos produtos desenvolvidos. ”

O CEIA trabalha com diferentes estratégias computacionais, que incluem triagem virtual, modelagem molecular e simulações.

Segundo Galvão, a aplicação da IA abrange etapas como a triagem virtual de grandes bibliotecas de moléculas, otimização de hits em leads com modelagem molecular e simulações computacionais, além do desenvolvimento de modelos QSAR/QSPR para prever propriedades farmacocinéticas, eficácia e toxicidade. A IA também começa a ser incorporada às fases clínicas, possibilitando avanços na personalização de tratamentos.

Colaboração entre setores impulsiona o impacto da IA

Um ponto em comum entre os especialistas é a importância da colaboração para que o potencial da IA se concretize. Para Marcel Frenkel, a sinergia entre startups, farmacêuticas, academia e big techs é essencial para transformar a capacidade disruptiva da IA em soluções reais. Sandro Albuquerque complementa essa visão, comparando o momento atual ao início do Projeto Genoma Humano, como uma curva exponencial de aprendizado. Já Arlindo Galvão reforça a importância da tríplice hélice (universidade, empresas e governo):

“Soluções inovadoras geradas na academia só se tornam sustentáveis e disponíveis para a sociedade em novos negócios com startups e grandes indústrias. Essa sinergia em conjunto do bom uso da IA é fundamental para enfrentar desafios complexos e acelerar a descoberta de medicamentos.”

Casos concretos já mostram o avanço dessa integração. A Servier, por exemplo, mantém parcerias com Google Cloud, Owkin e Aitia, aplicando IA em modelos como os gêmeos digitais — simulações virtuais capazes de prever o impacto de medicamentos antes dos testes clínicos. Em outra frente, a empresa colabora com a startup Elfie para o engajamento de pacientes crônicos com tecnologias de coaching digital.

Na UFG, destaca-se o projeto COVID-IA, que acelerou a descoberta de fármacos contra a COVID-19 em parceria com instituições do Brasil, África do Sul e Rússia. O centro também atua em doenças negligenciadas como Malária, Tuberculose, Leishmaniose e Esquistossomose, além de iniciativas de reposicionamento de fármacos para viroses emergentes.

Já na Ten63, a inovação acontece em ciclos contínuos de “prever → testar → aprender”, em que dados de ensaios bioquímicos e simulações são continuamente integrados para refinar os modelos de IA — aumentando as chances de sucesso e reduzindo custos.

Mais do que uma ferramenta, a Inteligência Artificial está se tornando catalisadora de um novo paradigma no setor farmacêutico. Ao unir velocidade, precisão e capacidade analítica sem precedentes, ela abre caminho para terapias mais personalizadas, eficazes e acessíveis. Ainda há desafios éticos, regulatórios e técnicos no horizonte, mas as experiências da Ten63, Servier e CEIA/UFG mostram que já é possível vislumbrar um futuro em que a descoberta de medicamentos não será mais limitada pela capacidade humana de processamento, mas ampliada pela inteligência algorítmica — com a sensibilidade e o julgamento insubstituíveis dos cientistas.

“Estamos apenas nos primeiros dias desse novo alvorecer da IA”. Sandro Albuquerque, Servier

“O potencial gerador de inovação em saúde a partir da análise de dados e simulações por IA é transformador.” Sandro Albuquerque, Servier


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Este artigo faz parte da 9° edição da revista bioBr, uma publicação realizada anualmente pela Abiquifi em parceria com a ApexBrasil por meio do projeto Brazilian Pharma & Health. Para conferir a revista completa, acesse: https://issuu.com/abiquifi/docs/biobr_9th_edition

Inovação em Saúde Animal: Biotecnologia como Motor Estratégico para o Desenvolvimento Nacional

A saúde animal vem ganhando destaque nas discussões sobre o futuro do agronegócio no Brasil. Além de suas ligações diretas com a produtividade e a qualidade dos alimentos, também impacta áreas-chave como o bem-estar animal, a sustentabilidade e o acesso a mercados. Assim, torna-se cada vez mais evidente a necessidade de maior alinhamento entre ciência, mercado privado e políticas públicas. Para entender melhor como essas frentes estão interagindo, conversamos com Luciano Paulino da Silva, pesquisador da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (Cenargen); Rodrigo Secioso, superintendente na Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP); Marcelo de Andrade Mota, diretor do Departamento de Saúde Animal; e Carlos Goulart, secretário de Defesa Agropecuária do Ministério da Agricultura e Pecuária.

Luciano Paulino da Silva destaca o papel da nanotecnologia verde como aliada da sustentabilidade na saúde animal. Segundo o pesquisador do Cenargen, a síntese verde de nanopartículas — especialmente de prata (AgNPs) e outros metais — vem sendo desenvolvida a partir de extratos vegetais do bioma Cerrado e de resíduos agroindustriais. Essas nanopartículas mostram aplicações antimicrobianas promissoras em ambientes como fazendas e até mesmo potencial uso em casos de sepse animal, já que testes in vivo em modelos murinos indicaram ausência de toxicidade.
“Essas rotas de produção estão alinhadas aos princípios da química verde e aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), ao mesmo tempo que reduzem impactos ambientais e se mostram economicamente viáveis quando considerada a escalabilidade industrial”, explica.

Paulino também enfatiza a importância estratégica da inovação no país:

“A relevância de um ecossistema de inovação bem conectado para a saúde animal está na capacidade de integrar conhecimento, recursos (humanos, financeiros, tecnológicos) e uma variedade de atores, acelerando o desenvolvimento de soluções que equilibrem produtividade, sustentabilidade e bem-estar animal. Tal ecossistema não apenas impulsiona avanços tecnológicos, mas também fortalece a resiliência do setor pecuário e a segurança alimentar global.”

Rodrigo Secioso reforça a importância das parcerias para impulsionar a inovação na saúde animal. Para ele, embora a necessidade de coordenação varie de acordo com o tipo de projeto e o grau de disrupção tecnológica, iniciativas mais inovadoras geralmente exigem maior colaboração entre os atores envolvidos.

“Normalmente, as empresas têm mais capacidade de inovar e levar tecnologias ao mercado, enquanto as universidades detêm o conhecimento científico. Essa parceria cria sinergia para promover um ambiente favorável à inovação”, afirma.

Secioso também destaca o papel estratégico das startups nesse ecossistema, atuando como ponte entre a ciência e a aplicação comercial. Nesse contexto, a Embrapa é reconhecida como protagonista na pesquisa em tecnologia agropecuária, com forte presença em projetos de biotecnologia e saúde animal.

Em meio a essa onda de transformação, o Programa de Inovação Radical (PIR), liderado pela Abiquifi, se destaca como um dos principais impulsionadores do desenvolvimento tecnológico na saúde animal. Focado em estimular a colaboração entre startups, empresas, instituições de pesquisa e investidores, o PIR promove iniciativas disruptivas que expandem as fronteiras científicas e tecnológicas no Brasil. Ao apoiar pesquisas avançadas, atrair investimentos e facilitar a interação regulatória, o programa potencializa o desenvolvimento de novos produtos e processos — como vacinas, fármacos inovadores e biotecnologias sustentáveis —, fortalecendo o ecossistema de inovação. Assim, a Abiquifi exerce um papel estratégico para reforçar a competitividade do Brasil diante dos desafios globais relacionados ao bem-estar animal, à sustentabilidade e à segurança alimentar.

Inovações Agrícolas: Redefinindo Saúde e Sustentabilidade

A relação entre saúde animal, sustentabilidade e bem-estar é cada vez mais evidente e estratégica no setor agropecuário. Segundo Luciano Paulino da Silva, práticas de manejo adequadas, prevenção de doenças e uso racional de recursos impactam diretamente a produtividade e a conservação ambiental. Nesse contexto, tecnologias como vacinas lipossomais, sistemas de liberação controlada de medicamentos e bioimpressão 3D ajudam a reduzir o uso de produtos químicos, aumentar o bem-estar animal e preservar a biodiversidade.

Inovações como a biofabricação de órgãos miméticos e a criopreservação de gametas fortalecem a resiliência dos rebanhos frente às mudanças climáticas e a doenças emergentes, enquanto sensores e diagnósticos rápidos permitem respostas ágeis e sustentáveis no manejo sanitário.

Essa interdependência entre saúde e bem-estar animal também é enfatizada por Marcelo de Andrade Mota e Carlos Goulart, do MAPA:

“Estudos das últimas décadas mostram forte associação entre altos padrões sanitários e indicadores de bem-estar animal, demonstrando que um não existe sem o outro.”

Eles também ressaltam que infraestrutura adequada, manejo eficiente e medidas sanitárias bem aplicadas resultam em animais mais saudáveis, menor dependência de medicamentos e maior produtividade — todos elementos-chave para sistemas sustentáveis de longo prazo.

Além disso, apontam a necessidade de adaptar os marcos regulatórios ao ritmo das inovações tecnológicas:

“O Ministério está continuamente elaborando e atualizando regulamentos para medicamentos veterinários e vacinas. Um dos principais objetivos desse esforço é acolher novas tecnologias, garantindo que os processos de registro de produtos sejam seguros e racionais.”

Rodrigo Secioso acrescenta que inovações na nutrição animal, especialmente as voltadas à redução de emissões de metano, têm ganhado destaque como ferramentas de mitigação ambiental, particularmente no Brasil, onde o rebanho bovino é expressivo. Ele também cita a importância de tecnologias para economia de água, soluções de reaproveitamento de resíduos para bioenergia, desenvolvimento de Ingredientes Farmacêuticos Ativos (IFAs), produtos biológicos inovadores e melhoramento genético.

Segundo ele, quando respaldadas por parcerias entre empresas, universidades e centros de pesquisa, essas inovações aceleram a aplicação prática da ciência, conectando sustentabilidade, saúde animal e tecnologia de forma sistêmica e eficiente.

A FINEP desempenha papel catalisador na promoção da inovação em saúde animal. Secioso aponta que a instituição apoia o setor por diferentes vias, como fundos de investimento, subvenções diretas e mecanismos de crédito.

“Atualmente, há 37 projetos em andamento — 17 financiados por crédito direto às empresas e 20 por subvenções —, totalizando cerca de US$ 265 milhões destinados ao desenvolvimento de novas tecnologias. Apenas em 2024, foram firmados nove novos contratos, somando aproximadamente US$ 90,8 milhões em investimentos. Esse volume de recursos reflete não apenas o potencial do setor, mas também a urgência de modernizá-lo frente aos desafios atuais de saúde, meio ambiente e produção”, explica.

Luciano Paulino da Silva conclui reforçando que a saúde animal é um pilar estratégico do agronegócio brasileiro, diretamente ligada à segurança alimentar global e à competitividade do país nos mercados internacionais. Ele cita iniciativas inovadoras do Laboratório de Nanobiotecnologia da Embrapa como exemplos claros de como ciência e tecnologia podem atuar juntas para um setor mais sustentável. Além das pesquisas com nanopartículas, o laboratório avança em projetos disruptivos como carne cultivada e análogos vegetais de peixe, utilizando tecnologias como bioimpressão 3D e matérias-primas de origem vegetal.

“Essas tecnologias não apenas reduzem os impactos ambientais da produção convencional, mas também oferecem alternativas alimentares seguras e nutritivas, alinhadas às tendências globais de consumo e sustentabilidade”, finaliza.

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A 9ª edição da bioBr destaca como tecnologias emergentes — da impressão 3D à nanotecnologia verde e vacinas lipossomais — estão revolucionando a saúde animal, unindo produtividade, sustentabilidade e cuidado com o bem-estar. O artigo destaca a importância de iniciativas como o Programa de Inovação Radical (PIR) da Abiquifi na conexão entre ciência, mercado e políticas públicas para acelerar soluções inovadoras no agronegócio. Exemplos incluem pesquisas da Embrapa e avanços regulatórios do MAPA que facilitam a adoção de novas biotecnologias. Com abordagem integrada e foco em inovação sustentável, o setor brasileiro de saúde animal se posiciona como protagonista na segurança alimentar global e na liderança em tecnologias de impacto. A bioBr é uma publicação da Abiquifi, em parceria com a ApexBrasil e curadoria da Biominas Brasil, reunindo tendências e avanços de ponta em saúde e biotecnologia.

Startups brasileiras de biotecnologia ganham destaque em premiação da KPMG

A KPMG está promovendo um concurso para identificar as startups mais inovadoras do Brasil. A vencedora participará do Web Summit Lisboa, considerado o maior evento de tecnologia do mundo, com todas as despesas pagas.

Embora o foco do evento seja tradicionalmente voltado para tecnologia da informação, a edição deste ano trouxe uma surpresa positiva: três empresas de biotecnologia figuram entre as finalistas — Biolinker, Qnity e Peptidus Biotech. O resultado chama a atenção para um setor historicamente visto como complexo e de alto custo para investimento, e que ainda não ocupa posição de destaque no histórico de inovação do Brasil.

A biotecnologia, no entanto, é responsável por avanços que transformam diretamente a saúde, incluindo medicamentos para tratamento de câncer, testes diagnósticos (como para Covid-19, infarto e análises genéticas) e dispositivos médicos (respiradores, stents, marca-passos, entre outros). Apesar do grande potencial, muitas soluções desenvolvidas no país não chegam ao mercado devido à dificuldade de captação de recursos para seu desenvolvimento.

Com o objetivo de mudar esse cenário, a ApexBrasil e a Abiquifi, por meio do convênio Brazilian Pharma & Health (BP&H), criaram o programa Brazil’s BEST. A iniciativa seleciona startups brasileiras de saúde com alto nível tecnológico, oferecendo suporte estratégico, mentorias e conexão com investidores globais. O programa também viabiliza a participação dessas empresas em eventos internacionais, ampliando sua visibilidade e aumentando as chances de atração de investimentos estrangeiros.

O destaque alcançado por startups de biotecnologia na premiação da KPMG reforça a importância de iniciativas que conectem inovação, capital e mercado, consolidando o Brasil como um player relevante na biotecnologia global.

Abiquifi discute com Ministério da Agricultura a estruturação de cadeias produtivas de insumos vegetais, com foco em Cannabis medicinal

Em reunião recente com o Ministério da Agricultura, a Abiquifi reforçou a importância de estruturar cadeias produtivas sustentáveis para insumos vegetais no Brasil, com destaque para a regulamentação do cultivo da Cannabis medicinal com fins farmacêuticos e a produção de Ingredientes Farmacêuticos Ativos (IFAs).

A iniciativa se alinha ao crescente interesse global por bioativos de origem vegetal e à necessidade de fortalecer a autonomia nacional na cadeia de insumos farmacêuticos.

Durante o encontro, foram abordados pontos estratégicos para viabilizar essa agenda no curto e médio prazo:

Interação com órgãos reguladores

Foi destacada a urgência de articulação interinstitucional para atendimento ao prazo estabelecido pelo STJ em relação à regulamentação da Cannabis medicinal, com envolvimento de órgãos como Anvisa, MDIC, Ministério da Saúde e Embrapa.

Pesquisa e desenvolvimento de sementes e cultivares

A Abiquifi ressaltou a necessidade de investimentos em P&D para o desenvolvimento de sementes, cultivares e material genético adaptados ao território brasileiro, garantindo viabilidade agrícola, regularidade de oferta e qualidade dos insumos.

Conexão com a Anvisa desde o início

Foi defendida a integração antecipada com a agência reguladora para garantir que a cadeia produtiva se estruture de forma alinhada aos padrões exigidos para a fabricação de IFAs, desde a origem vegetal até a etapa industrial.

Controle de qualidade e rastreabilidade

A criação de mecanismos robustos de controle de qualidade e rastreabilidade dos insumos foi apontada como pilar fundamental para assegurar segurança, eficácia e transparência na cadeia.

Próximos passos

A Abiquifi se comprometeu a auxiliar na construção de uma proposta técnica com diretrizes para regulamentação e desenvolvimento da cadeia produtiva, além de seguir mobilizando atores públicos e privados para construção de um marco regulatório moderno, sustentável e inovador.

Resultado preliminar do FIP-Saúde marca avanço no financiamento à inovação em saúde

No dia 05 de agosto, o BNDES, FINEP e Fundação Butantan tornaram público o resultado preliminar da escolha do gestor para o fundo de investimento em participações (FIP) no complexo econômico e industrial da saúde (FIP-Saúde).

O consórcio composto por Kortex Ventures e IKJ ficou em primeiro lugar seguido pela GreenRock em segundo lugar. O edital contou com a participação de 12 propostas no total e a segunda fase do edital selecionou 5 propostas para apresentação oral da tese de investimento com o resultado que foi divulgado ontem.

A iniciativa para a formação do fundo de investimento em participações é muito bem-vinda e vem ao encontro de uma necessidade alarmante no nosso ecossistema: falta de capital de risco para financiar ideias inovadoras com grande densidade tecnológica no setor de saúde. Historicamente, a inovação deveria seguir um percurso desde sua concepção em ambientes acadêmicos até o mercado passando por entidades pequenas e versáteis, mais comumente chamadas de startups, cujo o propósito único é tornar uma ideia disruptiva em produtos/serviços que melhoram a vida das pessoas de alguma forma. No caso do setor da saúde, as inovações com adensamento tecnológico (chamadas deep techs) assumem contornos ainda mais relevantes pois tais empresas se propõe a gerar medicamentos, tratamentos, dispositivos médicos, testes diagnósticos e outros tantos que impactam diretamente a vida das pessoas para bem. Acontece que os poucos ousados empreendedores da área no Brasil encontram um vácuo de financiamento que tantas vezes torna impeditivo o processo transformação da ideia potencial em produto no mercado. Ao saírem do ambiente acadêmico, existe pouco (muito pouco) capital de risco disponível para investir em tecnologias que exigem alta demanda de capital e longos ciclos de desenvolvimento. O resultado final disso é que quase nenhuma inovação do setor é desenvolvida no Brasil gerando uma dependência do mercado externo. 

Este fundo é um passo importantíssimo no processo de criação de um ambiente de investimento em tecnologias disruptivas no setor da saúde. O fato de 12 propostas terem sido enviadas demonstra que existe um apetite para o assunto que deve ser fomentado mas é necessário que mais ações sejam tomadas para favorecer o investimento de capital privado no país dentro do setor (como diminuição da taxa de juros, diminuição da taxa de impostos para importação de produtos e serviços não existentes no país, etc). Sem o envolvimento de capital privado, nenhum país é capaz de catapultar seu ecossistema de inovação para uma posição de protagonismo global. 
Importante acompanhar melhor compreender as teses de investimento que serão resultantes desse consórcio, pois o sucesso da iniciativa está intimamente relacionada ao sucesso do portfólio desse grupo. Precisamos ter cases de sucesso para gerar um momento positivo de investimento para o setor.